Vermelho Sangue: série brasileira mistura lobo-guará e fantasia juvenil em Guarambá

Ao estrear em 2025, Vermelho Sangue não apenas entrou na plataforma Globoplay — ela revolucionou o que significa fantasia brasileira. A série, criada por Cláudia Sardinha e Rosane Svartman, não copia os clichês europeus de lobisomens e vampiros. Em vez disso, ela planta esses seres no coração do Cerrado Mineiro, mais especificamente em Guarambá, santuário natural do lobo-guará. E isso faz toda a diferença.

Um lobo-guará em forma de mulher

Luna, interpretada por Letícia Vieira, não é apenas uma lobisomem. Ela é uma lobimoça-guará. Sua transformação não é um pesadelo hereditário, mas uma herança viva da fauna brasileira. Quando a lua cheia surge, seus olhos escurecem, garras crescem — e o pelo que brota em sua pele tem a textura e o tom avermelhado do lobo-guará, o canídeo mais emblemático do Cerrado. A ideia, segundo a diretora de caracterização Emi Sato, era afastar-se da imagem de monstros grotescos. "Quisemos beleza, sutileza. Cada cicatriz, cada olhar, cada ruga na pele durante a transformação conta uma história de dor e resistência", disse ela em entrevista. Os lobisomens da série não são iguais. Um tem cicatrizes em forma de raízes, outro, manchas que lembram folhas secas. É como se a natureza tivesse escrito sua identidade na pele deles.

A paixão que desregula a lua

A chegada de Alanis Guillén como Flora, uma humana curiosa e corajosa, desencadeia algo que nenhuma pesquisa farmacêutica previu: transformações fora do ciclo lunar. Quando Luna e Flora se beijam pela primeira vez, no vestiário do colégio, o céu escurece antes da hora. O sangue de Luna ferve. A maldição, que deveria ser controlada por medicamentos secretos produzidos por um grupo farmacêutico não identificado — onde sua mãe trabalha —, começa a rebelar-se. É aqui que a série se torna mais do que um conto de terror: ela se torna uma alegoria sobre identidade, amor proibido e corpo como campo de batalha. "Não é só sobre ser diferente. É sobre o que acontece quando alguém te vê, de verdade, e ainda assim te escolhe", diz Flora em um dos momentos mais tocantes do Episódio 4.

Vampiros que não envelhecem, mas carregam séculos

Vampiros que não envelhecem, mas carregam séculos

Enquanto Luna luta para controlar sua natureza, Pedro Alves e Laura Dutra entram como Michel e Celina, vampiros que chegam a Guarambá como estudantes estrangeiros — mas cuja pele pálida e olhos que parecem ter visto guerras antigas os revelam. Seus trajes são elegantes, quase etéreos: tecidos de seda envelhecida, colares de prata antiga, capas que não se dobram como as de humanos. "Eles não usam roupas. Eles vestem memórias", explica Emi Sato. A caracterização dos vampiros é intencionalmente oposta à dos lobisomens: enquanto estes têm marcas de luta, os primeiros têm marcas de tempo. Nenhum deles tem rugas, mas todos têm olhares que já viram o mundo mudar três vezes.

A ciência que quer curar o sobrenatural

A trama se sustenta em um mistério silencioso: um laboratório secreto, localizado nas proximidades do santuário, coleta sangue de Luna para testar uma possível cura. Mas o que a série não diz — e isso é intencional — é se essa cura é realmente um alívio, ou apenas um apagamento. A mãe de Luna, cujo nome ainda não foi revelado, é uma cientista que acredita estar salvando a filha. Mas será que ela está tentando eliminar o que a torna única? A série não responde isso ainda. Mas nos 10 episódios — cada um entre 26 e 32 minutos — ela constrói uma tensão sutil, quase poética. O Episódio 6, onde Michel rouba o sangue de Luna das mãos de Celina e foge ao amanhecer, é um dos mais visuais da temporada: a luz do sol corta as árvores como lâminas, e os reflexos na pele de Michel parecem fumaça.

Por que isso importa?

Por que isso importa?

Vermelho Sangue não é só entretenimento. É um ato de resistência cultural. Enquanto o mundo consome versões americanas e europeias de criaturas sobrenaturais, o Brasil finalmente criou as suas — e as colocou no chão do Cerrado, onde o lobo-guará corre em perigo de extinção. A série não fala diretamente sobre meio ambiente. Mas quando Luna corre pelas matas de Guarambá, com o vento agitando seu cabelo e o som dos grilos ao fundo, o espectador sente: isso é território. Isso é vida. E essa vida, como a dela, merece ser protegida — não caçada, nem estudada, nem curada. Apenas respeitada.

A série já tem 7,6/10 na IMDb, com 62 avaliações, e engajamento de 939 métricas específicas na plataforma. O trailer, de 2 minutos e 54 segundos, viralizou entre jovens de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul — onde o Cerrado ainda é lembrado, mas raramente celebrado na cultura pop. A produção, com áudio 5.1 e audiodescrição, mostra que a Globoplay não está apenas apostando em uma série. Está apostando em uma nova linguagem.

Frequently Asked Questions

Por que o lobo-guará foi escolhido como base para os lobisomens?

O lobo-guará é o maior canídeo da América do Sul e símbolo do Cerrado, bioma ameaçado que abriga 5% da biodiversidade global. Ao usá-lo como base, a série conecta a fantasia à realidade ecológica brasileira. Os criadores queriam afastar-se dos lobos europeus e criar uma identidade sobrenatural genuinamente nacional — algo raro no gênero. As características físicas dos lobisomens, como o tom avermelhado do pelo e as manchas no rosto, são inspiradas diretamente na pelagem do animal real.

Quem é Emi Sato e qual sua importância na série?

Emi Sato é a responsável pela caracterização visual de Vermelho Sangue, uma das principais forças criativas por trás da estética da série. Com experiência em produções internacionais, ela trouxe uma abordagem única: misturar referências históricas da moda europeia com elementos indígenas e rurais brasileiros. Seus designs não apenas definem os personagens, mas contam suas histórias — como as cicatrizes que revelam traumas de transformações anteriores ou os tecidos que parecem flutuar mesmo sem vento.

A série tem conexão com a realidade política ou ambiental do Brasil?

Sim, indiretamente. A ambientação em Guarambá, um local inspirado em santuários reais do Cerrado mineiro, é um comentário silencioso sobre a destruição desses biomas. O laboratório farmacêutico que explora Luna representa a exploração científica sem ética, que muitas vezes ocorre em áreas protegidas. A série não faz discurso político, mas seu cenário e simbolismo ecoam debates reais sobre preservação, ciência e direitos dos seres vivos — inclusive os que não são humanos.

Por que o amor entre Luna e Flora é tão central?

O romance entre as duas não é um detalhe — é o catalisador da trama. Enquanto o sangue de Luna reage às emoções, o amor verdadeiro desencadeia mudanças físicas que desafiam a lógica da maldição. Isso transforma o amor em um ato de resistência: não se trata apenas de aceitação, mas de poder. A série usa a fantasia para questionar: se o amor pode mudar a natureza de uma pessoa, será que a sociedade também pode mudar sua visão sobre o que é normal?

A série vai ter uma segunda temporada?

Ainda não foi oficialmente confirmada, mas os indicadores são fortes: o engajamento na Globoplay superou a média de séries originais da plataforma em 42%, e o final do Episódio 10 deixa pistas sobre a origem dos vampiros, o paradeiro da mãe de Luna e a existência de outros lobisomens no Brasil. A produção já está em negociações para expandir o universo, possivelmente explorando mitos indígenas da região Norte em futuras temporadas.